19.11.08

Mi Buenos Aires Querido - Parte 1 de 3

Segunda-feira, 13 de outubro de 2008.

Dentro de um avião da TAM, espero a decolagem para Buenos Aires. Não demora muito até começar a me divertir com as pequenas diferenças existentes entre Brasil e Argentina. Isto porque a aeromoça nos comunica pelo alto-falante haver uma regra do Ministério da Agricultura da Argentina que obriga as companhias aéreas a jogarem uma espécie de spray dedetizante pelo corredor do avião antes da decolagem. “Não é possível?!”, penso em voz alta. “Só pode ser uma gozação encontrada pelos hermanos para tirar um sarro com a nossa cara”. Não era. A aeromoça percorreu todo o corredor jogando um spray sobre nossas cabeças. Provavelmente um argentino mais sacana explicaria: “É para matar os piolhos de usted, macaquitos”.

Ao aterrisar no aeroporto de Ezeiza, por volta das 18h, olho pela janelinha do avião e vejo dois carregadores de mala fazendo a troca do turno com beijos de cumprimento no rosto. O tempo não podia ser melhor: nublado, chuvoso, e frio. Do jeitinho que eu gosto. Bom para tomar cafés, ler, usar jaquetas de couro, e tirar fotos em preto e branco.

No desembarque troco 50 reais por peso a uma absurda taxa de 1 Real para 1,03 pesos (o câmbio correto seria algo de 1 Real = 1,40 pesos). Paciência. Precisava pelo menos de ter algum dinheiro no bolso para eventuais gastos. Depois de apanhar as malas, vou para o lado de fora do desembarque atrás do funcionário que levaria eu e minha esposa Lorena até o hotel. Encontro-o e ele me pede para esperar alguns minutos. Enquanto isso, vou a uma lojinha para começar a ir me enturmando com os locais e desenferrujar meu portunhol. Pergunto ao vendedor qual o “mejor alfajor”. Ele, esperto, diz ser o mais caro, um que custa cinco pesos. Pergunta então qual o segundo “mejor”. Ele responde ser um tal de Jorgelim, que custa três pesos. Pago com anota de 50 pesos e recebo um olhar enfezado. Saboreio o alfajor enquanto sigo para a van que nos levará ao centro.

Alfajor Jorjelín
No caminho, percebo muitos carros parados em um parque com extenso gramado e muitas árvores que corre paralelo à rodovia. Inicialmente penso que os carros argentinos devem ser umas carroças por causa da quantidade de veículos enguiçados. Depois, percebo que os carros não estão com defeito. Considero então que os argentinos são bastante liberais e gostam de fazer estripulias amorosas em plena luz do dia, em locais públicos, e dentro de carros. Minutos mais de profunda análise, entendo que o que verdadeiramente estava acontecendo é que os hermanos estavam fazendo piquenique. Uau! Que legal! Pontos para a Argentina. Em questão de saber o quanto é prazeroso fazer um piquenique, eles estão bem à frente da gente.

Obelisco visto da Avenida Corrientes.

Ao chegar ao Hotel Dazzler Libertad, em frente à Plaza Libertad, na região central da cidade, somos recebidos por uma agente da CVC. Ela nos dá um mapa, marca o city tour que havíamos pago para o dia seguinte, e o jantar com show de tango para a quarta-feira à noite. Em seguida, tenta nos vender uns pacotes turísticos, que educadamente recusamos. Somos então levados ao nosso quarto. Ao entrar nele, percebo ser um quarto de fumante. Reclamo. Mas nada adianta. Somente poderão nos alocar para uma “habitácion de no-fumadores” no dia seguinte.

Depois de perceber que a garrafa de dois litros de água do hotel custava 25 pesos, decidimos ir atrás de um supermercado. O friozinho lá fora é maravilhoso. Há também uma fina garoa e as ruas estão molhadas. Melhor impossível. Como deve ser bom morar num lugar aonde seja possível usar roupas de inverno mais do que apenas uma semana por ano (como é o que acontece em Belo Horizonte). Coloco minha jaqueta de couro e saio de mãos dados com a Lorena para explorar os arredores de nosso hotel e, quem sabe, tomar um café.

Encontramos um supermercado. Dentro dele, exploramos os corredores atrás de água e demais curiosidades, como alfajores e cortes de carne que não existem no Brasil como, por exemplo, o asado de tira (costela de boi cortada em tiras).

Seguimos nossa caminhada de muitos quarteirões até o café La Biela, em Recoleta, perto do cemitério. Amei o lugar. Fundado na década de 50, tem muita personalidade e é bastante animado. Pedimos um sanduíche de “jamon e queso” no pão de miga (um pão de forma cujas fatias são finíssimas) e um café com leche.

Depois de tomar banho em chuveiro não muito bom (que ficava dentro de uma banheira, com cortina de plástico, e água jorrada sem muita pressão), apanhamos um táxi para jantar no restaurante Filo. Eu e Lorena gostamos razoavelmente do lugar. Nada de espetacular, mas ambiente moderninho e alternativo, e boas pizzas (pedimos um calzone de cogumelos que estava bastante saboroso).
Terça-feira, 14 de outubro de 2008.

Acordamos cedo devido ao compromisso do city tour (assim como nós e, principalmente os paulistas bregas, os argentinos também gostam de usar palavras em inglês para supostamente dar mais sofisticação às palavras). Do lado de fora da janela, o dia continuava do jeito que eu adoro; chuva fina e friozinho. O café da manhã é um pouco diferente do Brasil. Não havia frutas frescas, mas sim pêssegos e abacaxis em calda, além de grapefruit (conhecido como Pomelo na Argentina). Tinha também um saboroso mingau com passas e cereais, os clássicos croissants (doces e salgadas), salaminhos e lingüiças deliciosas, dulce de leche para passar no pão, geléias, queijos, batatas à espanhola (com cebola, cebolinha, e presunto), e ovos mexidos. Café da manhã justo (mas se pensar que a diária naquele hotel bem mais ou menos era de cerca U$ 180,00, a refeição matinal era fraca).

Depois de subir ao quarto, liguei a TV. Nela passava o Masters Series de Tênis de Madrid. Pensei a pena que é o Brasil não ter tenistas de alto nível enquanto a Argentina tem um punhado, como Nalbandian e Del Potro (que, inclusive, disputariam um jogo entre si pelas oitavas de final). Nas ruas, os hermanos tem o costume de assistir e torcer pelos seus tenistas. Vi muitas televisões ligadas na rua, em restaurantes e em lobbies de hotel transmitindo os jogos de tênis.

O city tour foi feito em um imenso ônibus. Felizmente, consegui assentar na primeira fileira, o que me permitiu ter uma visão melhor dos locais por onde passávamos. Gostei do passeio por oferecer uma visão geral dos principais pontos turísticas da cidade e por me situar geograficamente. Começamos o tour apanhando os turistas (a imensa maioria de brasileiros) em hoteizinhos mixurucos espalhados pelo centro. Em seguida, fomos até uma escultura de uma rosa gigante que abre e fecha. Percorremos um pedacinho do bairro de Palermo, e da Recoleta. Em seguida, paramos um tempo na Plaza de Mayo para tirar fotos da Casa Rosada (sede do governo federal), do Cabildo (um dos poucos edifícios remanescentes do período colonial espanhol), e da imponente e bela Catedral Metropolitana (onde está o túmulo do “Libertador” San Martín).


Cabildo

Casa Rosada

Seguimos o passeio passando pelo bairro de San Telmo e depois fizemos outra parada no bairro de La Boca. O local é bastante colorido, tem muitos turistas, artistas, argentinos dançando tango para os transeuntes, cafés, e é onde está o estádio La Bombonera, do Boca Juniors. Seguimos então para a região de Puerto Madero e de lá para o centro, onde terminou o tour.


Dançarinos de tango

O colorido bairro de La Boca





O almoço aconteceu no Museo de Jamon, um restaurante na região central que é decorado com dezenas de presuntos dependurados. O cardápio é especializado na cozinha espanhola. Por ser um pouquinho caro, pedi um pollo com aglio (com saboroso molho de tomate e, claro, bastante alho) e papas fritas. Lô pediu um frango à milanesa. Eu gostei mais do restaurante pelo decoração do que pela comida. Ah, nele quem paga a conta com efectivo (ou seja, dinheiro vivo) tem desconto de 15%. Infelizmente só tinha tarjeta (cartão de crédito).


Restaurante Museo de Jamon

Atravessamos a extensa Avenida 9 de Julio e seguimos para a conhecida Calle Florida (a 25 de Março de Buenos Aires). Aqui abro um parêntesis: na Argentina, sabiamente como acontece nos EUA, a luz vermelha do sinal para pedestres começa a piscar quando o sinal para carros ainda está verde, permitindo maior tempo de travessia. Quando o sinal para carros, muda para o amarelo, o sinal de pedestres já parou de piscar e está vermelho. No Brasil, tristemente, nada disso acontece. Aqui, a luz para pedestres pisca junto do sinal amarelo, o que ocasiona correria e “sai da minha frente”.

Subimos a pé a Calle Florida (uma espécie de 25 de Março chique da Argentina), que me fez lembrar da Rua da Praia, em Porto Alegre. Encontramos uma casa de cambio e trocamos reais por pesos à cotação 1 para 1,40. Lorena apaixonou por uma loja de departamento chamada Falabella. Em seguida, conheci a Galeria Pacífico e tomamos sorvete no Freddo. Apesar de muitos falarem da Rua Flórida, para mim foi uma decepção. Não gostei da muvuca. Achei que faltava o clima europeu naquele trecho de Buenos Aires.

Uma das galerias da Calle Florida

Com chuvinha fina e friozinho, chegamos à Plaza San Martín, que achei belíssima. De lá apanhamos o subte (abreviação de subterrâneo, ou seja, o metrô) para ir até a livraria El Ateneo Grand Splendid, na Avenida Santa Fé. Deslumbrante. O local era um antigo teatro que se transformou em uma livraria. Já o palco, é onde está o café. Evidentemente, sentamos numa mesa para tomarmos um cafezinho e comermos umas media-lunas (croissant).

Tíquete do "subte"


Plaza San Martín

Livraria El Ateneo

Seguimos a pé para o hotel. Lá, mudamos para um quarto de não fumadores, que era muito melhor que o anterior. Apesar de não valer os muitos dólares da diária, era confortável. Mas, acredite se quiser: à noite, como acontece em muitos hotéis em Buenos Aires, os safados desligam o ar-condicionado central (assim, digo: os quartos têm ar-condicionado, mas o hóspede não pode controlar sua temperatura).

À noite, jantamos no Il Mirassol em Puerto Madero. Nada de mais. Gostamos apenas da lingüiça que pedimos de entrada. Ah, aqui explico o seguinte: em todos os restaurante existe o “servicio de mesa”, uma espécie de couvert que costuma custar cerca de 7 ou 8 pesos por pessoa. Porém não há como recusá-lo. Aceitando-o ou não, este virá discriminado na conta. Sendo assim, o jeito é torcer par que o servicio de mesa seja bom e compense pelo dinheiro a ser pago. Geralmente é uma cesta de pães com manteiga. Ah, e além deste, é claro que ainda há os 10%. Uma coisa não redime a outra (pelo menos é o que eu acho. Ou será que fui um trouxa e paguei pelos dois desnecessariamente?). Completando; pedimos um bife de chorizo e uma porção de batatas (os Argentinos tem xodó por batatas. Estas são encontradas nos cardápios preparadas das mais diversas maneiras: fritas, coradas, purê, gratinada com creme, à provençal, etc). Arroz é difícil de encontrar. Feijão ou farofa? Impossível. Outra dica: peça sempre a salsa (molho) chuimichurri, que é preparado com azeite, ervas e um toque de pimenta calabresa. É uma delícia sobre a carne. Apesar de gratuito sempre que pedir a carne, nem todos os garçons lembrar de servi-la durante a refeição.

Um comentário:

Ligia disse...

Olá Rusty!
Cheguei até aqui, por recomendação de Guilherme Lopes, que citou voce, e seu post sobre o Festival BH Sabor & Arte, no blog de uma pessoa do Rio. Olha, devo lhe dizer que fiquei encantada com o Blog do Rusty!!! Eu que sou fã de gastronomia, viagens, fotografia, arte em geral, vivo "fuçando" em blogs alheios, para me atualizar, sobre o que acontece no mundo, nessas áreas de interesse. Ainda que eu mesma não tenha nenhum blog, vivo na web me deliciando com as dicas e experiências de pessoas antenadas, como voce. E por essas razãoes eu fui além do post sobre o festival, e fiz uma "varredura" (rsrsrs)nos seus livros, filmes, e blogs recomendados, nos posts mais antigos, e nos marcadores, onde vibrei com as suas viagens, particularmente a de Buenos Aires, que fez com sua esposa. Simplesmente sensacional!!! Eu que já sou apaixonada (não! tarada) pela Argentina (já estive lá dez vezes) fiquei extasiada com sua descrição dos lugares visitados e notas curiosas, e principalmnete com as fotos! Muito bom! Agora ficarei de olho em suas próximas andanças por aí, para me abastecer de informações. Adorei também os marcadores de música, e publicitários de miolo mole (tanto que repassei para pessoas que adoram o assunto), as fotos espetaculares! Enfim tudo! Parabéns por sua criatividade, talento e bom gosto, pois a formatação e textos também são de "prima". Um abraço, de uma carioca, que virou fã. Que venham mais posts!