15.7.08

Costumes gastronômicos

Recentemente li o ótimo livro Estrela Solitária, de Ruy Castro. Gostei bastante dos trechos em que o autor escreve sobre os costumes gastronômicos no passado, sejam estes exercidos por índios ou por Garrincha e seus familiares e amigos. Listo abaixo alguns enxertos do livro.

“Quanto a beber, os índios já produziam uma bebida espumante, de alto teor alcoólico, fermentada a partir de frutas ou raízes de aipim, com a qual os homens da tribo, incluindo o pajé e o morubixaba, embriagavam-se dias e noites nos seus feriados longos”.

“Nos dois estados [Pernambuco e Alagoas], não restara um único caeté para contar com que temperos os seus ferozes antepassados haviam comido o bispo Sardinha em 1556. E nem um ferocíssimo tupinambá para contar como eles próprios haviam dizimado e também comido os caetés – antes de serem, por sua vez, exterminados com ainda maior ferocidade pelos portugueses”.

“É verdade que, sob o permanente olhar do branco, os fulniôs perderam muito de seus antigos costumes. Um deles, o endocanibalismo: o primogênito de cada família era morto, assado e comido com mel pelos avós. Acreditavam que, com isso, a estirpe se fortificava. O pai da criança não participava do repasto, mas tinha a obrigação de ir colher o mel”.

“O cachimbo [uma gororoba caseira que servia para curar os mais diversos males] era uma mistura de cachaça com mel de abelhas e canela em pau, posta para curtir numa garrafa envolta com cortiça e pendurada numa viga do teto. O pai se certificava antes se a cachaça era da boa. O cachimbo não era usado para fins recreativos ou embriagantes – pelo menos, não de propósito -, mas medicinais. As mulheres o tomavam durante a gravidez. Depois do parto, continuavam tomando-o enquanto durasse o resguardo. Adultos e crianças o tomavam como purgante, xarope, fortificante e para combater gripes, lombrigas, coqueluche, asma, e dor de dentes. Aos bebês, era dado como tranqüilizante: uma ou duas colheres antes de dormir, para não terem sonhos agitados”.

“Outra de suas habilidades [de Amaro, pai de Garrincha] era como matador de cabritos: a pedido da vizinhança, abatia vinte ou trinta a cada fim de semana, com uma paulada definitiva na testa de cada bicho. Como pagamento ficava com o bucho, as tripas, o fígado, o sangue, e a cabeça do animal, com os quais preparava ciclópicas buchadas para ele e seus amigos. O abate de um cabrito exigia quase um ritual, e Amaro o executava entre gargalhadas e largas talagadas, como numa cerimônia pagã”.

“[Amaro] atribuía parte de seus poderes românticos a uma possante dieta matinal: mocotó, ovos de pata, água de cipó-cravo e chá de catuaba”.

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